As relações entre sector público e sector privado na saúde
Apesar da crescente utilização do setor privado e da sua relevância como opção de escolha para os cidadãos, o Serviço Nacional de Saúde permanece como o pilar estruturante do sistema de saúde em Portugal. Esta é uma das principais evidências reveladas na mais recente Nota Informativa do Observatório da Despesa em Saúde: As relações entre o setor público e setor privado na saúde, realizada pelos investigadores Carolina Santos e Pedro Pita Barros, detentor da Cátedra BPI | Fundação ‘la Caixa’ em Economia da Saúde, no âmbito da Iniciativa para a Equidade Social, uma parceria entre a Fundação ‘la Caixa’, o BPI e a Nova SBE.
A análise, que pretende compreender como funcionam as diferentes componentes do sistema de saúde em Portugal e como se articulam as responsabilidades do Estado, das famílias e das entidades privadas, foi elaborada tendo como referência dois planos distintos: a origem dos fundos utilizados para pagar os cuidados de saúde (financiamento) e quem presta esses cuidados (a prestação).
Financiamento: setor público mantém papel central, mas famílias pagam cada vez mais
Em Portugal, o financiamento das despesas em saúde continua a ser garantido, sobretudo, por impostos, refletindo o papel central do Serviço Nacional de Saúde (SNS) como seguro público. Em 2022, o seguro público representava 55,37% do total do financiamento em saúde – um ligeiro recuo face aos 58,62% registados em 2000. Simultaneamente, os pagamentos diretos das famílias ganharam expressão, passando de 24,98% em 2000 para 29,65% em 2022, revelando um aumento do esforço financeiro direto das famílias. Já os subsistemas públicos, como a ADSE, registaram uma diminuição na sua representatividade, descendo de 6,27% para 3,02% no mesmo período.
Apesar do crescimento percentual do seguro privado de saúde, este mantém ainda um peso relativo limitado no financiamento global.
Prestação de cuidados: reforço da presença do setor privado, mas o SNS mantém-se como pilar do sistema
No plano da prestação de cuidados de saúde, observa-se uma crescente utilização do setor privado, o que evidencia a procura por maior diversidade e rapidez no acesso a serviços. Ainda assim, os dados indicam que o SNS permanece como o pilar estruturante do sistema de saúde, garantindo a universalidade, a equidade e a solidariedade no acesso.
Entre 2013 e 2025, verificou-se um crescimento consistente da utilização do setor privado, que passou de 7,61% para 15,34% no total de acessos registados. Após a pandemia, assistiu-se a uma retoma progressiva da procura de serviços de urgência hospitalar privados, culminando, em 2025, com um aumento significativo das consultas em consultórios privados. Contudo, mesmo perante este crescimento do setor privado, a maioria da população continua a procurar apoio no SNS, frequentemente em articulação com serviços como a linha SNS24, cuja utilização aumentou substancialmente durante e após a pandemia.
Um sistema em evolução, mas estruturalmente estável
Os dados analisados refletem um sistema de saúde onde o setor público continua a ser o pilar central dos cuidados de saúde na doença, mas que partilha cada vez mais o seu espaço com o setor privado. Esta realidade verifica-se tanto na ótica agregada – analisando as despesas com prestadores – como na perspetiva individual, através das decisões dos cidadãos no momento em que necessitam de cuidados.
Apesar das mudanças nas preferências de utilização e do crescimento do setor privado, a estabilidade do sistema de saúde manteve-se ao longo dos últimos 10 a 15 anos, com a prestação pública e o recurso ao SNS a continuarem predominantes.
O futuro desta articulação entre setores dependerá da capacidade de desenhar políticas públicas que reconheçam as tensões e interdependências existentes, sem abdicar dos princípios fundamentais que regem o SNS: universalidade, equidade e solidariedade.
Notas Informativas: Observatório da Despesa em Saúde
As relações entre o setor público e setor privado na saúde é a décima série Notas Informativas: Observatório da Despesa em Saúde (elaboradas no âmbito da Cátedra BPI | Fundação “la Caixa” em Economia da Saúde, atribuída a Pedro Pita Barros, no âmbito da Iniciativa para a Equidade Social, uma parceria entre a Fundação “la Caixa”, o BPI e a Nova SBE) que pretende divulgar análises sintéticas relativamente a temáticas atuais sobre o setor da saúde.
Iniciativa para a Equidade Social
A Iniciativa para a Equidade Social é uma parceria entre a Fundação “la Caixa”, o BPI, e a Nova SBE, que visa impulsionar o setor social em Portugal com uma visão de longo prazo. Traçando um retrato do setor social em Portugal e desenvolvendo programas de investigação e capacitação para apoiar organizações sociais, a iniciativa envolve oito projetos e duas cátedras.
Sobre a Fundação ”la Caixa”
A Fundação ”la Caixa” iniciou em 2018 a sua implantação em Portugal, consequência da entrada do BPI no grupo CaixaBank. Em 2025, destina 50 milhões de euros a projetos sociais, de investigação, educativos e de divulgação cultural e científica.
Sobre a Cátedra Fundação “la Caixa” em Economia da Saúde
Parte da Iniciativa para a Equidade Social BPI | Fundação “la Caixa” a cátedra em Economia da Saúde foi atribuída ao Professor Pedro Pita Barros e tem como objetivo promover a investigação sobre o sector da saúde, bem como o conhecimento e discussão da sociedade portuguesa quanto a tendências, desafios e políticas do setor da saúde. Desenvolve investigação para analisar novas tendências e desafios no setor da saúde, através de medições de impacto, estudos e análises em temas como Acesso aos Serviços de Saúde, Recursos Humanos e Envelhecimento da População.
Sobre a Nova SBE
A Nova SBE é a mais prestigiada business school em Portugal e uma das principais business schools da Europa. É a faculdade de ciências económicas, financeiras e de gestão da Universidade NOVA de Lisboa. O atual Diretor é Pedro Oliveira (PhD, University of North Carolina at Chapel Hill). A Nova SBE é membro do CEMS desde dezembro de 2007 e tem atribuição Triple Crown em todo o mundo, o que implica a acreditação pela EQUIS, AMBA e AACSB. Foi a primeira business school portuguesa a adquirir acreditações internacionais e reconhecimento de renome mundial no ensino superior. A visão internacional da Nova SBE também se reflete na adoção do inglês como o principal idioma de ensino. A grande maioria dos cursos de licenciatura e todos os programas de mestrado, MBA e PhD são lecionados em inglês.