Bolsa Nacional para Projetos de Investigação

Estudo abre caminho a estratégias de prevenção personalizadas, centradas na modulação das bactérias do intestino, com potencial para promover o equilíbrio emocional, controlar a impulsividade e proteger a saúde mental e física dos jovens.

A sexta edição da Bolsa Nacional para Projetos de Investigação em Microbiota, atribuída pela Biocodex Microbiota Foundation, distinguiu o projeto MINDSET (Mapping INteractions of the biDirectional gut-brain axiS in adolEscent risk-Taking behaviour), liderado por Joana Ferreira Gomes*, investigadora do i3S – Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto e professora da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP). O projeto será financiado com 25 mil euros, valor atribuído anualmente pela Fundação para apoiar investigação pioneira na área da microbiota.

A ligação entre o microbioma intestinal e os comportamentos de risco na adolescência é ainda um campo em desenvolvimento, mas os dados disponíveis apontam para uma relação estreita entre o equilíbrio do microbioma intestinal e o funcionamento do cérebro. “Sabe-se que o microbioma comunica com o sistema nervoso central através do chamado eixo intestino-cérebro, influenciando funções cognitivas, emocionais e comportamentais. As bactérias intestinais produzem substâncias químicas, como a serotonina e a dopamina, que atuam como mensageiros e regulam o humor, a impulsividade e a tomada de decisão”, explica a investigadora Joana Ferreira Gomes.

De acordo com a cientista do i3S e professora da FMUP, “estes mecanismos são particularmente relevantes na adolescência, fase marcada por maior instabilidade emocional e vulnerabilidade a fatores externos, como o stress ou a pressão social”. A adolescência, especifica Joana Ferreira Gomes, é caracterizada por um aumento das taxas de mortalidade e morbilidade, sobretudo devido ao maior envolvimento em comportamentos de risco, como a condução imprudente, o consumo excessivo de álcool, a atividade sexual desprotegida e o consumo de substâncias ilícitas, fatores que aumentam significativamente a probabilidade de consequências adversas para a saúde.

Estudos com modelos animais indicam que alterações na microbiota durante este período – provocadas, por exemplo, pelo uso excessivo de antibióticos – podem ter impactos duradouros na memória, no comportamento e na saúde mental. É com base nestas evidências, sublinha a investigadora, que o projeto MINDSET «pretende aprofundar o conhecimento sobre como o microbioma pode ser um fator protetor contra comportamentos de risco, de que é exemplo o consumo de substâncias, a condução imprudente ou a impulsividade”.

 A equipa de Joana Ferreira Gomes, que integra investigadores do grupo «Glial Cell Biology» do i3S, vai recorrer à recolha de amostras de fezes e sangue em adolescentes dos 12 aos 18 anos para analisar a composição da microbiota intestinal e avaliar marcadores hormonais e inflamatórios no sangue. “Estes dados serão cruzados com os resultados de questionários e tarefas comportamentais, que permitirão avaliar o grau de impulsividade, a procura por experiências intensas, a regulação emocional e a predisposição para assumir riscos”, revela a investigadora.

Ao mapear as interações entre o microbioma e o sistema neuro-imuno-endócrino, o projeto poderá ter um impacto significativo na forma como compreendemos e abordamos os comportamentos de risco na adolescência. “Ao identificarmos ligações entre o microbioma intestinal, marcadores biológicos e comportamentos, poderemos desenvolver estratégias de prevenção mais precoces, precisas e personalizadas”, frisa Joana Ferreira Gomes. E explica que, a longo prazo, estes dados podem contribuir para intervenções baseadas na modulação do microbioma como forma de promover o equilíbrio emocional, reduzir a impulsividade e os comportamentos de risco prejudiciais e proteger a saúde mental e física dos adolescentes.

O recrutamento de voluntários ainda está a decorrer e as demonstrações de interesse podem ser submetidas aqui: m2child.med.up.pt/participe/mindset

* Joana Ferreira Gomes é Professora Auxiliar na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto e investigadora no grupo «Glial Cell Biology» do  i3S – Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto. A sua formação académica inclui Medicina e Microbiologia, tendo desenvolvido um percurso académico nas áreas de Histologia e Embriologia, e um percurso de investigação em Neurociências. A sua investigação tem-se centrado sobretudo nos mecanismos neurobiológicos associados à dor crónica. Mais recentemente, iniciou uma nova linha de investigação que cruza a sua formação multidisciplinar e experiência profissional, focando-se no eixo intestino-cérebro em perturbações do neurodesenvolvimento.

EQUIPA DE INVESTIGAÇÃO 

Joana Ferreira-Gomes1,2, João Relvas1,2, Inês Mendes-Pinto1,2, Alexandre Rodrigues1,2, Sofia Pinto1,2, Teresa Correia-de-Sá1,2, Sofia Marques3,4

AFILIAÇÕES 

  1. i3S – Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto;
  2. Departamento de Biomedicina, Faculdade de Medicina da Universidade do Porto
  3. CIPD-Centro de Investigação em Psicologia para o Desenvolvimento, Instituto de Psicologia e Ciências da Educação, Universidade Lusíada Porto.