Evolução das despesas diretas em saúde em Portugal

Estudo revela redução de 2,1 pontos percentuais nas despesas diretas em saúde entre 2015 e 2022, mas destaca aumento da vulnerabilidade financeira para crianças e grupos de baixos rendimentos.

Implementar medidas que protejam grupos socioeconómicos vulneráveis, que não se limitem à população idosa, é imperativo para esbater diferenças.

A mais recente nota informativa do Observatório da Despesa em Saúde Evolução das despesas diretas em saúde em Portugal, revela uma significativa melhoria na proteção financeira dos cidadãos residentes em Portugal face às despesas diretas em saúde entre 2015 e 2022. O estudo, da autoria da investigadora do Nova SBE Health Economics & Management Knowledge Center, Carolina Santos aponta, no entanto, para um agravamento da vulnerabilidade financeira em grupos etários mais jovens, assim como para a persistência de um gradiente socioeconómico na alocação de rendimento a despesas de saúde.

O estudo que se insere no âmbito da Iniciativa para a Equidade Social, uma parceria entre a Fundação ‘la Caixa’, o BPI e a Nova SBE, analisou dados do Inquérito às Despesas das Famílias de 2015 e 2022 do Instituto Nacional de Estatística (INE), e revelou que o peso das despesas diretas em saúde no rendimento líquido dos cidadãos portugueses diminuiu de uma média de 5,56% em 2015 para 3,46% em 2022. Esta melhoria foi impulsionada pela redução das despesas diretas per capita, que passaram de 445,26€ para 365,45€, e pelo aumento do rendimento líquido médio per capita, que subiu de 9.344,71€ para 12.081,08€.

A nota revela que a população com 65 ou mais anos foi a que mais beneficiou das medidas de proteção financeira. O peso das despesas diretas em saúde no rendimento líquido dos idosos passou de 8,5% em 2015 para 4,7% em 2022, o que representa uma melhoria significativa. Em 2015, a desproteção financeira dos idosos era 1,74 vezes superior à da população não idosa, mas em 2022 este valor reduziu para 1,52 vezes. Além disso, a percentagem de idosos com despesas em saúde (acima de 25% do rendimento líquido) também diminuiu consideravelmente, especialmente no grupo com 85 ou mais anos, onde a incidência passou de 7,2% em 2015 para apenas 1,5% em 2022.

Apesar destes dados, nem todos os grupos etários beneficiaram igualmente das melhorias. Crianças com idades entre os 5 e os 14 anos viram a sua desproteção financeira aumentar. Para o grupo de crianças entre 5 e 9 anos, a percentagem em situação de pobreza, risco de pobreza, ou que viu a sua condição de pobreza agravar-se devido a despesas diretas em saúde aumentou 0,94 pontos percentuais entre 2015 e 2022. Para o grupo dos 10-14 anos, o aumento foi ainda mais acentuado, com uma subida de 1,41 pontos percentuais.

Apesar dos avanços observados, o estudo revela que a regressividade das despesas diretas em saúde persiste, especialmente para quem tem rendimentos mais baixos. Embora esses grupos tenham visto uma redução nas suas despesas diretas, de 7,60% para 4,53% do rendimento líquido, ainda alocam uma maior percentagem do seu rendimento a essas despesas, em comparação com os rendimentos mais elevados.

As despesas com medicamentos, aparelhos e material terapêutico constituem a maior parte das despesas diretas em saúde e esta categoria teve um aumento relativo, passando de 55,85% em 2015 para 59,73% em 2022. Esta tendência é particularmente visível entre a população idosa, que é mais dependente desses tipos de despesas.

Entre 2015 e 2022, foi implementado um conjunto de políticas públicas com o objetivo de reduzir os encargos diretos em saúde e repor o poder de compra da população, que foi significativamente afetada durante o Programa de Assistência Económica e Financeira a Portugal (2011-2014). Entre as medidas adotadas destacam-se a redução e eliminação de taxas moderadoras no Serviço Nacional de Saúde (SNS) para diversos grupos, incluindo menores de 18 anos e utentes referenciados, o aumento da comparticipação do Estado em medicamentos, incluindo a comparticipação a 100% para doenças crónicas graves, como Esclerose Múltipla e insuficiência renal, e a inclusão de mais vacinas gratuitas no Programa Nacional de Vacinação para grupos de risco. Além disso, o aumento do valor da Retribuição Mínima Mensal Garantida (RMMG) e a atualização do Indexante de Apoios Sociais (IAS) também foram medidas relevantes para melhorar a capacidade financeira das famílias.

Ainda assim, o estudo conclui que, apesar dos avanços, é necessário continuar a implementar políticas públicas que protejam grupos socioeconómicos vulneráveis, além da população idosa. Para reduzir ainda mais a regressividade dos pagamentos diretos em saúde, o relatório sugere que Portugal considere mecanismos semelhantes aos do sistema de saúde espanhol, onde os copagamentos estão diretamente relacionados com o rendimento dos utentes e existem limites mensais máximos de despesa, o que ajuda a reduzir a carga financeira sobre as famílias mais vulneráveis.

Embora os progressos registados entre 2015 e 2022 sejam significativos, os desafios persistem, especialmente para crianças e indivíduos de baixos rendimentos, sendo crucial que o sistema de saúde continue a evoluir para garantir uma maior equidade no acesso e nos custos para todos os cidadãos.

Notas Informativas: Observatório da Despesa em Saúde:

Evolução das despesas diretas em Saúde em Portugal é a nona nota da série Notas Informativas: Observatório da Despesa em Saúde (elaboradas no âmbito da Cátedra BPI | Fundação “la Caixa” em Economia da Saúde, atribuída a Pedro Pita Barros, no âmbito da Iniciativa para a Equidade Social, uma parceria entre a Fundação “la Caixa”, o BPI e a Nova SBE) que pretende divulgar análises sintéticas relativamente a temáticas atuais sobre o setor da saúde.

Sobre a Iniciativa para a Equidade Social:

A Iniciativa para a Equidade Social é uma parceria entre a Fundação “la Caixa”, o BPI, e a Nova SBE, que visa impulsionar o setor social em Portugal com uma visão de longo prazo. Traçando um retrato do setor social em Portugal e desenvolvendo programas de investigação e capacitação para apoiar organizações sociais, a iniciativa envolve oito projetos e duas cátedras.

Sobre a Cátedra Fundação “la Caixa” em Economia da Saúde:

Parte da Iniciativa para a Equidade Social BPI | Fundação “la Caixa” a cátedra em Economia da Saúde foi atribuída ao Professor Pedro Pita Barros e tem como objetivo promover a investigação sobre o sector da saúde, bem como o conhecimento e discussão da sociedade portuguesa quanto a tendências, desafios e políticas do setor da saúde. Desenvolve investigação para analisar novas tendências e desafios no setor da saúde, através de medições de impacto, estudos e análises em temas como Acesso aos Serviços de Saúde, Recursos Humanos e Envelhecimento da População.

Sobre a Fundação ”la Caixa”:

A Fundação ”la Caixa” iniciou em 2018 a sua implantação em Portugal, consequência da entrada do BPI no grupo CaixaBank. Em 2023, destinou 50 milhõe de euros a projetos sociais, de investigação, educativos e de divulgação cultural e científica.

Sobre a Nova SBE:

A Nova SBE é a mais prestigiada business school em Portugal e uma das principais business schools da Europa. É a faculdade de ciências económicas, financeiras e de gestão da Universidade NOVA de Lisboa. O atual Diretor é o Prof. Pedro Oliveira (PhD, University of North Carolina at Chapel Hill). A Nova SBE é membro do CEMS desde dezembro de 2007 e tem atribuição Triple Crown em todo o mundo, o que implica a acreditação pela EQUIS, AMBA e AACSB. Foi a primeira business school portuguesa a adquirir acreditações internacionais e reconhecimento de renome mundial no ensino superior. A visão internacional da Nova SBE também se reflete na adoção do inglês como o principal idioma de ensino. A grande maioria dos cursos de licenciatura e todos os programas de mestrado, MBA e PhD são lecionados em inglês.