- Os cuidados paliativos devem fazer parte da estratégia nacional para a gestão da saúde da população
- É um direito garantido através da Lei de Bases dos Cuidados Paliativos (2012), mas este continua por cumprir
- Existem em Portugal cerca de 100.000 adultos com necessidades paliativas, chegando as equipas a apenas a 30%, e cerca de 8000 crianças com necessidades paliativas, representando aproximadamente 40% das despesas de internamento hospitalar nos serviços de pediatria de Portugal continental e mais de 85% das mortes em contexto hospitalar
A Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos foi recebida, na sexta-feira, dia 21 de junho, numa audiência com o Ministério da Saúde, com o objetivo de exigir um maior investimento nos cuidados paliativos no Serviço Nacional de Saúde.
“Os cuidados paliativos são cuidados de saúde especializados que se centram em aliviar os sintomas e o sofrimento do doente com doença grave, idealmente em paralelo com o tratamento curativo.
Existe uma forte base de evidência que comprova que o seu início precoce tem elevado impacto na qualidade dos cuidados, na satisfação dos profissionais, do doente/família e com diminuição dos custos.
Pelo facto de se centrarem no grupo de doentes com maiores necessidades de cuidados de saúde e com custos mais elevados associados a esses cuidados, os cuidados paliativos devem fazer parte da estratégia nacional para a gestão da saúde da população.
Em Portugal esta área de cuidados de saúde tem sido alvo de alguma atenção e investimento, no entanto, revela-se insuficiente para as crescentes necessidades”, explica Catarina Pazes, Presidente da APCP, à margem desta reunião.
O acesso a cuidados paliativos é um direito garantido através da Lei de Bases dos Cuidados Paliativos (2012), mas este continua por cumprir na maioria das situações. Existem em Portugal cerca de 100.000 adultos com necessidades paliativas, chegando as equipas a apenas a 30%. O mesmo acontece em relação aos cuidados paliativos pediátricos, existem no nosso país cerca de 8.000 crianças com necessidades paliativas, representando aproximadamente 40% das despesas de internamento hospitalar nos serviços de pediatria de Portugal continental e mais de 85% das mortes em contexto hospitalar.
Segundo os dados conhecidos, existem ainda poucas equipas para as necessidades que o país tem, sobretudo a nível comunitário, o que faz com que muitas regiões do país estejam a descoberto, nomeadamente a nível da comunidade (das 63 equipas comunitárias previstas pelo PDECP, temos em Portugal apenas 21 (33%) com os requisitos mínimos exigidos). Apesar de já existirem equipas intra-hospitalares de suporte em Cuidados Paliativos (EIHSCP) em todos os hospitais, a maioria continua com insuficiência de recursos humanos, tendo em conta as recomendações do plano estratégico de desenvolvimento para os cuidados paliativos.
Além disso, muitos profissionais vêm travada a possibilidade de desenvolverem competências diferenciadas nesta área, nomeadamente formação avançada e prática (que tem sido paga pelo próprio e, em muitos casos, sem dispensas de serviço).
Existe uma carência efetiva de camas de cuidados paliativos afetas à RNCCI, e neste contexto particular, sabemos, a maioria das unidades necessita de maior acompanhamento, suporte e monitorização da sua atividade. A interligação com a RNCCI é inexistente (apenas partilham plataforma de registo e alocação de doentes), e a título de exemplo: no Baixo Alentejo não há camas, e em Lisboa, há apenas 15 camas de internamento. É ainda nesta tipologia (UCP-RNCCI) que também são, por vezes, internadas crianças com necessidades paliativas.
Perante este cenário de fraco investimento nos cuidados paliativos e face às necessidades prementes nacionais, a APCP exige:
- Dotação das equipas de Cuidados Paliativos (CP) e Cuidados Paliativos Pediátricos (CPP) (intra-hospitalares e domiciliárias) com os recursos humanos mínimos exigidos pelo Plano Estratégico de Desenvolvimento para os Cuidados Paliativos, por forma a garantir o seu normal funcionamento, resposta assistencial em tempo útil e maior impacto na qualidade de vida de crianças, adultos e suas famílias, assim como na redução da utilização hospitalar;
- Dotar todos os Agrupamentos dos Centros de Saúde com, pelo menos, uma ECSCP, sendo fulcral atender às dotações já estudadas como mínimas. Das 63 previstas apenas 21 estão a funcionar com os requisitos mínimos (Relatório da CNCP, 2024);
- Criar condições para as ECSCP assegurarem atendimento telefónico de 24h/dia, 7 dias por semana para atendimento a doentes e famílias e a profissionais que asseguram diariamente os cuidados diretos na comunidade (forte impacto na redução de recursos ao SU);
- Criar Unidades de Cuidados Paliativos em todos os hospitais do SNS, dotadas dos recursos humanos previstos nas recomendações da Administração Central dos Serviços de Saúde e com número de camas adaptado às necessidades;
- Incentivo à criação de resposta efetiva em CPP na Região do Alentejo e Algarve, atualmente desprovidas de qualquer tipo de resposta;
- Incentivo à constituição e sedimentação de equipas domiciliárias de CPP, de base hospitalar, em centros onde se preveja seguimento mínimo de 150 a 200 crianças por ano. Nas restantes equipas, possibilitar a criação de condições para a realização de apoio domiciliário, sempre que clinicamente justificado e desde que se verifique custo-efetividade, e garantir a possibilidade de acesso permanente (24h por dia, pelo menos telefónico);
- Criar condições para que as equipas especificas de cuidados paliativos sejam obrigatoriamente compostas por profissionais que detenham formação avançada e competência reconhecida em cuidados paliativos, através da realização de estágios em serviços/equipas especializadas na área;
- Reconhecer e dar oportunidade de progressão de carreira a todos os profissionais que se dediquem em exclusivo a Cuidados Paliativos;
- Desenvolver um software robusto, eficiente e desenhado por profissionais de saúde, que permita estreitar a colaboração, comunicação e partilha de informação entre a Rede Nacional de Cuidados Paliativos e rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados;
- A articulação entre a RNCP e a RNCCI é imprescindível face à necessidade de garantia de continuidade de cuidados e à possibilidade de articulação perfeita que garanta a transição de tipologia de cuidados face ao tempo clínico e não ao tempo social que resulta da escassez de resposta sou lugares na RNCCI;
- As dotações de profissionais afetos às UCP-RNCCI necessitam de revisão face ao diminuto número de ECTS preconizado, assim como é essencial o acompanhamento e apoio destas estruturas que permita a resposta de qualidade que se exige;
- Criar uma estratégia de incentivos que esteja assente na monitorização da qualidade dos cuidados e satisfação dos utentes e famílias, por forma a garantir a implementação e crescimento das equipas especializadas de suporte.
Catarina Pazes, alerta ainda “a APCP recebe diariamente pedidos de ajuda por parte de doentes e familiares sobre onde e a quem recorrer para uma consulta de cuidados paliativos, uma avaliação ou um acompanhamento efetivo, denotando a falta de resposta existente. Mantém-se uma organização espartilhada, centralizada no contexto hospitalar e não no doente, ao contrário do que verificamos na maioria dos países europeus com redes de cuidados paliativos bem desenvolvidas”.
Sobre a APCP:
A Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos (APCP) é uma associação sem fins lucrativos que congrega profissionais de diferentes áreas e proveniências (medicina, enfermagem, psicologia, serviço social, reabilitação, nutrição, espiritualidade, entre outros) que se interessam pelo desenvolvimento dos Cuidados Paliativos em Portugal. A APCP pretende ser uma associação forte e dinâmica que reforce e melhore o panorama da formação e prestação dos Cuidados Paliativos em Portugal, e que tem como fim último e central, melhorar a qualidade de vida dos doentes com doença avançada, incurável e/ou progressiva, e das suas famílias.